terça-feira, 8 de novembro de 2016

Jamais vou me conformar!!!




Por Afranio Silva Jardim

Às vezes, bate na gente um certo desânimo. Somos tentados a pensar que as coisas devem ser assim mesmo e que a nossa “luta” é inglória, que as nossas aspirações de justiça social contrariam a “natureza das coisas”.
Em outras palavras, somos tentados a admitir que a perversidade e ganância do ser humano têm de levar à criação e manutenção da divisão da sociedade em classes, divisão esta própria do sistema capitalista. Dizem: não tem jeito, pois uns têm que ser ricos e outros têm que ser pobres. Se todos forem ricos, quem vai nos servir nos necessários trabalhos braçais?
Enfim, dizem que a injustiça social seria natural, pois o homem é egoísta e individualista. O ser humano deseja tudo para si. Se sobrar algo, que os outros catem as migalhas. Dizem, ainda, “ eu quero ser feliz e, para isso, não posso me importar com o sofrimento dos outros”. Em resumo: o capitalismo estaria mais de acordo com a natureza humana e as ideias de Marx e Engels seriam incompatíveis com o individualismo, que a todos nos caracteriza.
Aceitar ser esta a nossa realidade é profundamente doloroso. Pode nos levar à submissão e à depressão. Será que os valores que nortearam toda a trajetória de nossa vida são irrealizáveis, são incompatíveis com a natureza humana? Será que temos de capitular e aceitar a triste situação que nos asfixia? Seria ingenuidade acreditar em uma sociedade igualitária, baseada na solidariedade, fraternidade, enfim, seria possível uma sociedade mais justa?
Não tenho dúvida de que a nossa história social está caracterizada pelos conflitos entre as classes sociais. A história nos mostra que sempre uma classe social oprimiu as demais, através do poder econômico e todos os demais instrumentos de coerção e persuasão. Não é de hoje que a classe subalterna assimila a ideologia da classe dominante. Hoje, este é o papel estratégico e predominante dos grandes meios de comunicação de massa.
Não tenho dúvida, entretanto, de que a nossa sociedade já foi muito pior: a guerra foi uma constante necessária para a dominação de territórios na antiguidade, sendo escravizados os vencidos, quando não exterminados;  a servidão era a base da economia na Idade Média, idade das trevas; os descobrimentos de outros continentes (na verdade, invasão) levou ao genocídio dos povos nativos e à escravidão de populações africanas, asiáticas e outras.
Enfim, por incrível que possa parecer, vendo a trajetória fraticida da humanidade, percebemos que o mundo de hoje é menos ruim …
Disto tudo, resulta uma outra reflexão: por que a sociedade de hoje é menos ruim que as sociedades do passado? A resposta nos anima: porque os oprimidos não aceitaram este determinismo social. Porque muitos deram sangue e suas vidas para não aceitar a opressão, as injustiças, o processo social de exploração do homem pelo homem. Porque sempre surgirão novas “Anas Júlias” …
Então levantamos a cabeça e afastamos o desânimo e o conformismo. A rebeldia é fundamental. Por isso, a juventude é fundamental. A história não para e sua evolução se dá através de um dinamismo dialético, que as forças conservadoras jamais conseguirão deter.
Não podemos desistir e temos de resistir, até mesmo em homenagem a todos aqueles que pereceram, na maioria ainda jovens, na luta por um mundo melhor. Se a sociedade já foi pior, é sinal que pode melhorar. Temos que manter válidos os nossos corretos valores e lutar para que eles, ao menos, permaneçam orientando as futuras gerações.
Temos pressa, mas tudo em termos sociais é muito lento. Atualmente, somos minoria, mas poderemos ser majoritários, quando o povo tiver cultura e adquirir consciência política. Quando o povo compreender o processo econômico de exploração a que está submetido. A cultura nos libertará …
Não estaremos presentes para colher os frutos desta possível e gradual melhoria social, mas resta a esperança de que estaremos tentando algo em prol de nossos netos ou bisnetos. A “luta” é boa por si só … Como dizia Eduardo Galeano, a utopia nos faz caminhar, embora ela permaneça sempre distante.
Por ora, por absoluta falta de condições objetivas para o sucesso, qualquer perspectiva revolucionária está descartada. Temos, sim, que “ganhar” os jovens para o nosso lado, mostrar a eles quais são os melhores valores. Todos devem ter as mesmas oportunidades de ser realizarem socialmente. É possível uma sociedade que não seja baseada na competição, no lucro, na concorrência, na ganância e na cobiça. É possível uma nova sociedade. É possível uma nova cultura. É possível um novo homem.
Enfim, não desanimo, embora a idade tenha diminuído em mim o açodamento juvenil. Não abro mão das minhas utopias, embora já não tenha tantas condições de correr em sua direção. Não aceito os “fatos consumados” e acho que podemos, algum dia, no futuro, subverter os fatos.
Jamais abandonarei a “luta por justiça social”, pois não consigo achar natural que as pessoas tenham tantos sofrimentos em razão de sua pobreza. Termino, dizendo: quando virem o meu caixão sendo levado para a sepultura, tenham certeza de que ali vai um eterno inconformado, um inadaptado, um rebelde nato.
Espero ter deixado caída uma semente por este nosso caminho de vida percorrido …
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Primavera, de 2016

Afranio Silva Jardim.
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Afranio Silva Jardim é mestre e livre-docente em Direito Processual Penal. Professor Associado da Faculdade de Direito da Uerj (graduação, mestrado e doutorado).
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